Pombagira

Salto alto e minissaia. Make brilhando e cabelo arrumado. Ela dança até o chão, é segura e sexy. Troca olhares contigo. E com o outro. E mais um. Sorri como se não fosse nada, empresta um pouco do seu mundo. Ela toma do seu drink, te empresta um isqueiro, fuma do seu cigarro. Não te toca em nenhum momento, apenas chega um pouco perto enquanto dança. E vai embora.

Ela sabe como chamar sua atenção sem mesmo olhar pra você. Dança com as amigas e dá risadas. Joga o cabelo para trás, mostra a nuca esperando por vento. Deixa o suor escorrer pelo rosto, pelas costas e pernas. Não se importa. Movimenta-se por causa da música, não pára um segundo, de um lado para o outro, como se não percebesse que está sendo observada.

Até o último acorde da última música, até que as luzes se acendam, ela te olha nos olhos sem nenhum medo de se mostrar. Dá um sorriso de lado. Mas as luzes acendem e ela não é mais quem você acreditava. Ela baixa os olhos, foge do seu olhar. Não há mais sorrisos gratuitos, o sol apagou tudo.

Ela tira o salto alto e pisa reto no chão, os pés doem. A minissaia não é mais tão curta e o decote nem faz mais diferença. O cabelo desce pelas costas e esconde aquela parte do corpo que você cobiçou a noite toda. Ela não é mais sua. Ela é a minha menina.

Minha menina não quer saber de sorrisos, quer apenas um canto, silêncio, água com gás. Não quer barulho nem ser o centro das atenções. Apenas quer estar ali. Ninguém dança ao seu redor, ninguém fala seu nome em voz alta, ninguém bate palmas para sua performance. Ela é a minha menina.

Todo o sexo que ela parecia querer durante a noite foi embora no primeiro sinal de claridade. Ela foge do monstro dentro de si, o prende por mais uma semana, até que a próxima noite caia e deixe que a fera saia para passear. Mas não encoste nela, mesmo durante a noite, dependendo do toque, ela pode voltar a ser apenas a minha menina, baixar o olhar e desaparecer do caminho.

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